Desde que o governo Temer anunciou a intenção de privatizar a Eletrobras, em 2017, que temos alertado que por trás dessa negociata está o mega investidor Jorge Paulo Lemman, do grupo 3G. De lá pra cá a 3G não só aumentou sua participação acionária como indicou nomes para postos estratégicos no Conselho de Administração e na Diretoria Executiva da Holding.
O bilionário brasileiro que vive na Suíça não quis esperar a privatização para controlar a empresa e hoje, através da Diretoria Financeira da Eletrobras implanta o projeto Orçamento Base Zero (OBZ). Mas você sabe o que é o OBZ?
De acordo com a própria Eletrobras, “é um processo recorrente que objetiva criar uma cultura sustentável de gerenciamento dos recursos”. Aparentemente nada de mais nisso, afinal, quem poderia ser contra o gerenciamento sustentável dos recursos? O problema do OBZ não é sua teoria, mas os efeitos práticos de sua aplicação em diversas empresas e a inadequação dessa metodologia, ou melhor, ideologia em uma empresa com as características da Eletrobras.
O princípio básico do Orçamento Base Zero, como o próprio nome já indica, é que o orçamento previsto para o ano não tenha por base o orçamento do ano anterior e que anualmente todas as despesas sejam “desafiadas”, ou seja, devem ser disponibilizados recursos apenas àquelas atividades que tenham “maior retorno”.
Os resultados dessa “ideologia” aplicadas no Brasil e em outros países por empresas do grupo 3G são uma busca desenfreada por cortes, cortes e mais cortes, que têm como primeiras vítimas os trabalhadores. Empresas como a Ambev são conhecidas por pagarem péssimos salários e possuírem alta rotatividade de mão de obra. Empresas centenárias como a estadunidense Heinz-Kraft (fabricante do famoso ketchup Heinz), adquiridas pelo grupo 3G apresentaram nos últimos anos prejuízos bilionários, pois a “ideologia” dos cortes do OBZ reduziu os investimentos em pesquisas de novos produtos e na qualidade dos mesmos, fazendo com que perdessem mercado.
Para os investidores do grupo 3G a perda de qualidade, de mercado ou mesmo a quebra de suas empresas não é problema, a final, o compromisso deles é com o acionista. Comprar empresas em dificuldades, promover cortes irresponsáveis, arrochar ao máximo os trabalhadores a fim de aumentar suas margens de lucro é o modus operandi do grupo 3G mundo a fora, metodologia que buscam implantar agora na Eletrobras.
A questão é que Eletrobras não é uma fábrica de ketchup, possui responsabilidades demais com o Brasil para ser exposta a um modelo de negócio voltado para a obtenção de resultados de curto prazo, mas que pode torná-la incapaz de prover a infraestrutura de que o país precisa.
O negócio mais importante das empresas do grupo Eletrobras não é produzir e transmitir energia, o principal negócio de nossas empresas é a confiabilidade. Ou seja, ganhamos mais quando nossos equipamentos estão disponíveis para a produção e somos penalizados caso não estejam. Será que a Eletrobras do OBZ vai continuar investindo na manutenção de seus ativos, ou os gestores serão “desafiados” a aumentarem os intervalos das manutenções para atingirem mais resultados? Será que manteremos nossos equipamentos atualizados ou seremos “desafiados” a mantê-los até que venham a falhar? Será que a Eletrobras vai investir na qualificação e treinamento de sua mão de obra ou vai preferir “desafiar” os trabalhadores a trabalharem para além do seu limite e partir para a terceirização irrestrita aumentando a exposição a falhas humanas?
Desde que Wilson Pinto assumiu a empresa em 2016, a Eletrobras tem apresentado resultados financeiros extremamente positivos, porém o que se vê, por outro lado, é a redução contínua e acentuada no quadro de empregados, colocando muitos em condição de sobre carga de trabalho e a prioridade na distribuição de dividendos aos acionistas em detrimento da realização de novos investimentos. O aumento de sinistros em equipamentos, que, por vezes, deixa regiões no escuro. Essa forma de “fazer gestão”, privilegiando o lucro imediato ao em vez da sustentabilidade de longo prazo, já quebrou muitas empresas por aí. Mas no caso da Eletrobras as coisas não são tão simples e as conseqüências da ideologia do custo mínimo já causou muita morte e destruição, como no caso da Vale em Mariana e Brumadinho, por exemplo.
Esta é a maior empresa do setor elétrico da América Latina, que construiu ao longo de décadas a espinha dorsal do sistema elétrico brasileiro, e é responsável pela geração de 1/3 da energia consumida no país, por 48% das linhas de transmissão, por 66% das subestações estratégicas e pela gestão de 52% da água armazenada nos reservatórios das hidrelétricas do Brasil. A Eletrobras é a principal responsável pela segurança energética dessa nação de 210 milhões de habitantes e tem papel indispensável na expansão do setor elétrico, além de operar e manter as maiores barragens do país, com potencial de dano, em caso de rompimento, simplesmente incalculável.
Esperamos que os dirigentes das nossas empresas tenham juízo e se lembrem que o Brasil ainda vai precisar de uma Eletrobras com excelência operacional por muitas e muitas décadas.
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